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Artigo – Escritura pública de transação: O avanço de sua utilização na advocacia extrajudicial
01 DE FEVEREIRO DE 2024
A transação é um acordo entre as partes com o objetivo de prevenir ou encerrar uma disputa, conflito ou litígio. Trata-se de uma autocomposição em que as próprias partes envolvidas resolvem os seus desentendimentos, evitando a necessidade de uma demanda judicial.
A transação pode ser relacionada a inúmeras questões e direitos, desde que sejam de caráter privado. Entre tais direitos, os mais comuns são os patrimoniais, familiares, contratuais, trabalhistas e sucessórios. A transação também pode ocorrer por questões relacionadas a prestação de serviço ou direito do consumidor.
Desde que respeitadas as normas de ordem pública e as regras específicas previstas na legislação, inúmeras são as possibilidades de se utilizar a transação para solucionar ou evitar conflitos ou litígios.
Nas palavras de Christiano Cassettari, em sua obra “Elementos de Direito Civil – Obra completa em Volume Único – 7º edição, p.363”:
O acordo de vontade entre os interessados (pois inexiste transação legal), o direito litigioso ou duvidoso (pois senão haverá renúncia ou reconhecimento de um direito) e a intenção de extinguir coisa litigiosa ou duvidosa (pois o objetivo é evitar riscos de uma futura demanda ou extinguir um litígio já instaurado, para transformar algo inseguro e incerto em seguro e certo) são elementos constitutivos de uma transação.
As regras específicas que regulamentam a transação no ordenamento jurídico brasileiro estão previstas nos artigos 840 a 850 do Código Civil. O artigo 840 do CC, diz que “é lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas”, trazendo a legalidade para esse tipo de acordo amigável.
A transação pode ser realizada por instrumento particular ou escritura pública, a depender do caso específico. O artigo 842 do CC traz essa afirmação e o comando de que, se recair sobre direitos contestados em juízo, será feita por escritura pública, ou por termo nos autos, assinado pelos transigentes e homologado pelo juiz.
A legislação traz o regramento de que a transação só é permitida sobre direitos patrimoniais de caráter privado justamente por não poder gerar prejuízos para aqueles que dela não participaram, assim como só poderá ser aproveitada por seus participantes. Tal regramento está previsto no artigo 844 do CC, que estatui:
Art. 844. A transação não aproveita, nem prejudica senão aos que nela intervierem, ainda que diga respeito a coisa indivisível.
§1 o Se for concluída entre o credor e o devedor, desobrigará o fiador.
§2 o Se entre um dos credores solidários e o devedor, extingue a obrigação deste para com s outros credores.
§3 o Se entre um dos devedores solidários e seu credor, extingue a dívida em relação aos co-devedores.
Carlos Eduardo Elias de Oliveira e João Costa-Neto, em “Direito Civil – Volume Único, p.710”, ensinam que “a transação tem natureza declaratória: ela não gera transmissão de direitos, mas, apenas a declaração ou o reconhecimento deles por ficção do art.843 do CC”.
Seguindo, ainda, os ensinamentos dos autores acima citados, em referida obra (p.709), a transação pode ser:
- a) extrajudicial: dá-se quando o direito em litígio não está sendo discutido em processo judicial. Deve ser feita por escrito e, se a lei exigir escritura pública para a negociação de qualquer dos direitos envolvidos, também a transação abrangendo esse direito deverá ser por escritura pública (art. 842, CC). Assim, se a transação envolve um imóvel de valor superior a 30 salários mínimos, ela deverá ser por escritura pública por força dos arts. 108 e 842 do CC;
- b) judicial: dá-se quando o direito controvertido já é objeto de processo judicial.
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, na obra “Manual de Direito Civil – Volume Único (6º edição) p.838”, explicam que “Com o advento do Código Civil de 2002, a transação passou a ser regulada como uma modalidade contratual típica e nominada, incluída expressamente no título dedicado às “várias espécies de contratos”.
Stolze e Pamplona, ainda na obra acima citada (p.838), explicam as demais características da transação:
Trata-se, evidentemente, de um contrato bilateral, em função das concessões recíprocas; comutativo, na equivalência das obrigações assumidas; e oneroso, em que o benefício recebido por um deve corresponder a um sacrifício patrimonial do outro.
A lógica de uma transação é de que ela seja um contrato paritário, tendo as partes iguais condições de negociação, para estabelecer livremente as cláusulas contratuais, sobretudo no que diz respeito às concessões de cada um.
Outras regras importantes sobre a transação estão previstas, como já dito, nos arts. 840 a 850 do CC, as quais devem ser cuidadosamente analisadas diante de cada caso concreto.
O crescimento da utilização da escritura pública para transações pelos advogados está cada vez mais intenso, e a justificativa é muito simples: entre realizar uma transação extrajudicial da qual não irão levar à homologação judicial, por instrumento particular ou por escritura pública, é evidente que a opção mais segura será o instrumento público.
Primeiramente, é importante ressaltar que a transação sempre poderá ser feita por escritura pública, mesmo quando não seja obrigatória. Isso ocorre pela segurança que a escritura pública passa às partes por se tratar de um documento público, lavrada por um tabelião de notas, que atua com imparcialidade, dando a fé pública para a transação realizada, garantindo a validade do ato e a segurança jurídica necessária.
Desse modo, a transação realizada por escritura pública tem todas as vantagens em relação ao instrumento particular, e o custo, diferentemente do que se imagina, é muito baixo, tendo em vista que nos casos em que a escritura pública é opcional, em muitas tabelas estaduais há um desconto, a exemplo de São Paulo, onde o desconto é de 40% (quarenta por cento).
O custo-benefício da escritura pública de transação é gritante, quando se analisa com cautela toda a segurança que ela promove ao acordo, além do fato de que, se a transação não for judicial, ela não precisa ser levada para homologação em juízo. A escritura pública, por si só, já é um título executivo extrajudicial, conforme o inciso II do art. 784 do Código de Processo Civil (CPC).
Na prática, o instrumento particular de transação em âmbito extrajudicial, mesmo que não seja obrigatória a homologação judicial, acaba sendo levado para a citada homologação, para que as partes possam ter mais segurança, mesmo que esta demanda judicial seja tecnicamente inapropriada, e, para que o instrumento particular possa se tornar um título executivo extrajudicial, precisa cumprir os demais requisitos exigidos pelos incisos III e IV do art. 784 do CPC, a depender do caso concreto.
Por esse motivo é que a escritura pública de transação acaba contribuindo com o Poder Judiciário. E essa contribuição se dá de duas formas: a principal, que é própria da transação, ou seja, evita uma demanda judicial; e a acessória, que se dá pelas características inerentes ao ato notarial, onde a segurança jurídica se torna mais robusta, e as partes não necessitam, nem cogitam, levar para a homologação em juízo, uma vez não terem a mesma insegurança jurídica passada pelos instrumentos particulares.
Assim como a transação tem o objetivo de prevenir litígios, uma das funções do tabelião também é a de prevenção de litígios, o que comprova ainda mais que a escritura pública é muito apropriada para realizar esse ato legitimado em nossa legislação, que é a transação.
Atualmente a procura para se realizar transação por escritura pública está crescendo consideravelmente, e o número de advogados que estão procurando os tabelionatos de notas para realizarem transações de todo tipo, desde que em caráter privado, respeitando as normas cogentes e a legislação que rege a transação, está cada vez maior.
Para o advogado, essa é uma ótima ferramenta de trabalho, pois, além de proporcionar segurança aos seus clientes, ele pode contar com o trabalho do tabelionato de notas, que normalmente redige a escritura pública de transação nos moldes do acordo realizado, o que acaba gerando economia de tempo para o advogado, que só precisa revisar e aprovar a minuta da escritura, verificando se está como por ele foi solicitado, e deixando para comparecer ao cartório somente quando a escritura pública de transação estiver pronta e seu conteúdo aprovado por todos.
Além disso, atualmente os tabelionatos de notas possibilitam a assinatura eletrônica, por meio de videoconferência realizada na plataforma do e-notariado, podendo as partes e os advogados realizarem o ato em seu escritório ou em qualquer outro lugar, bastando, apenas, ter internet acessível no local onde se encontra. As partes também não precisam estar juntas no mesmo lugar, podendo cada uma delas estar no escritório de seu respectivo advogado, ou em qualquer outro lugar.
Com toda essa facilidade e segurança jurídica, além do valor reduzido, fica evidente a vantagem de se utilizar a escritura pública para realizar todo e qualquer tipo de transação que esteja dentro das regras legais, o que justifica o aumento da procura dos advogados para a realização da transação por meio de escritura pública.
Uma outra importante vantagem para o advogado em utilizar a forma pública é que, caso queira, ele pode contar com a ajuda do tabelião de notas, que também é um profissional do Direito, para trocar ideias e opiniões sobre o ato de transação que está a elaborar e os termos ideais para serem inseridos no ato, sem qualquer tipo de custo adicional.
Acresça-se que, em alguns casos, a transação pode envolver a necessidade de registro no Cartório de Imóveis para que um imóvel passe a estar em nome de outrem. Antes da Lei do Marco Legal das Garantias, por uma interpretação (a nosso sentir, equivocada), não era viável o registro da transação por falta de previsão no rol de atos jurídicos registráveis estampado no art. 167, I, da Lei de Registros Públicos. Entretanto, essa interpretação indevida perdeu total amparo com o acréscimo feito ao referido inciso pela Lei do Marco Legal das Garantias: foi acrescido o item 48, que esclarece que qualquer ato jurídico de mutação jurídico-real imobiliário é registrável, ressalvadas as hipóteses legais de averbação1. Logo, a transação pode ser registrada. Basta que ela seja formalizada na forma legalmente exigida, conforme exposto neste artigo.
Enfim, nunca é demais lembrar que ao notário compete lavrar escrituras, e a ele é concedida por lei a fé pública para os atos que pratica, além de ter o dever de promover a segurança jurídica, com imparcialidade, imprimindo segurança e prevenindo litígios. Além disso, o tabelião de notas responde com seu patrimônio por danos causados por dolo a terceiros. Por isso, o instrumento público lavrado por tabelião de notas é extremamente confiável e seguro.
__________
1 Art. 167 – No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos. (Renumerado do art. 168 com nova redação pela lei 6.216, de 1975).
I – o registro: (Redação dada pela lei 6.216, de 1975).
(…)
- de outros negócios jurídicos de transmissão do direito real de propriedade sobre imóveis ou de instituição de direitos reais sobre imóveis, ressalvadas as hipóteses de averbação previstas em lei e respeitada a forma exigida por lei para o negócio jurídico, a exemplo do art. 108 da lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). (Incluído pela lei 14.711, de 2023)
Fonte: Migalhas
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